Essa mudança de comportamento vem sinalizando um avanço no mercado de produtos masculinos do setor brasileiro de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos, com reflexos na ampliação na cesta de compras. Até alguns anos atrás, as vendas se concentravam principalmente em desodorante e lâmina de barbear. Mas elas estão aumentando também em outras categorias e hoje o mercado brasileiro de produtos masculinos já ocupa o segundo lugar, atrás apenas dos Estados Unidos.
De acordo com a Euromonitor Internacional, de 2011 a 2016, o faturamento do setor cresceu 94,4%, passando de R$ 10,07 bilhões para R$ 19,6 bilhões. No mercado de perfumaria, por exemplo, as vendas aumentaram de R$ 5,1 bilhões para R$ 11,9 bilhões. Em desodorantes, foram de R$ 2,8 bilhões para R$ 4,9 bilhões. Em segmentos mais novos, como o de produtos de banho exclusivos para homens, as vendas partiram de R$ 11,9 milhões em 2011 e alcançaram R$ 261 milhões no ano passado.
E o potencial masculino deve continuar. Segundo Elton Morimitsu, analista sênior da Euromonitor, a previsão é que o setor alcance um faturamento de R$ 26,7 bilhões em 2021 – um incremento de 36% em relação a 2016 (veja tabela).
Esses números revelam uma saudável transformação da sociedade como um todo. Se no passado, por causa do machismo, os homens eram desestimulados a cuidar da aparência do corpo, hoje esse tipo de mentalidade ficou para trás. Segundo João Carlos Basilio, presidente executivo da ABIHPEC (Associação da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos), “trata-se de um movimento contínuo e, cada vez mais, o público masculino se conscientiza da importância desses tratamentos para o fortalecimento da autoestima, do bem-estar, da saúde e do sucesso pessoal e profissional”. Diversos estudos confirmam o maior interesse deles por cuidados com o corpo.
Pesquisa do Instituto Qualibest realizada recentemente mostrou que 43% dos homens já se consideram vaidosos e 54% frequentam regularmente salões e barbearias. A Minds&Hearts, especializada em estudos comportamentais, entrevistou no primeiro semestre do ano passado 414 brasileiros de 16 a 59 anos, das classes A, B e C, e descobriu que 45% deles buscam com frequência informações sobre tratamentos e cosméticos masculinos na internet ou em outros meios.
“A rotina do homem brasileiro moderno requer uma grande diversidade de produtos de cuidados pessoais para praticidade do dia a dia. A indústria está atenta e vem disponibilizando não somente produtos, mas também novidades e inovações, a fim de atender às demandas de um consumidor cada vez mais exigente”, afirma Basilio.
Produtos e serviços exclusivos
O fenômeno se reflete também na onda das barber shops, um tipo novo de barbearia que combina tratamentos modernos com um visual de antigamente e vem se espalhando pelo país. Elas estão resgatando um tipo de cliente que havia trocado as barbearias antigas, que ofereciam um leque limitado de produtos e serviços, pelos cabeleireiros unissex – muitas vezes o mesmo da esposa e dos filhos.
Agora, ele quer um momento e local exclusivos e espera ser atendido por um profissional que entenda das tendências de moda, ofereça opções de cortes, conheça os cosméticos masculinos e dê conselhos para cuidar do cabelo e da barba. A ida ao barbeiro deixou de ser mera necessidade para se tornar um momento de prazer e cuidado pessoal.
Segundo os especialistas, os homens trazem desejos e necessidades específicos em relação aos cuidados com a pele, a barba e o cabelo. São essas características que as indústrias enfatizam nos produtos destinados especialmente ao público masculino. A pele deles tende a ser mais oleosa pela presença maior de glândulas sebáceas, que respondem justamente à testosterona, hormônio masculino.
A hidratação exige produtos de textura mais suaves, segundo o dermatologista carioca Murilo Drummond, professor titular do Instituto de Pós-Graduação Carlos Chagas. A área médica que estuda a saúde e a aparência do cabelo e dos pelos chama-se tricologia. Segundo o médico Luciano Barsanti, presidente da Sociedade Brasileira de Tricologia, a indústria lançou diversos tipos de espuma e gel de barbear, adstringentes, condicionadores e hidratantes pré e pós barba.
De acordo com o analista sênior da Euromonitor, uma das principais diferenças do consumidor masculino, em relação às mulheres, é a busca por produtos que ofereçam praticidade e descompliquem sua rotina de cuidados. “Os homens dedicam menos tempo à aparência, compram menos produtos e esperam facilidade e conforto nos itens usados”, conta Elton Morimitsu. Enquanto as mulheres passam, em média, 42 minutos por dia cuidando do corpo, esse tempo se limita a 28 minutos no caso dos homens.
Por isso, os produtos multifuncionais que apresentam diversos e evidentes benefícios, como, por exemplo, cremes faciais que hidratam a pele, previnem rugas, oferecem proteção solar, controlam o brilho e fornecem vitaminas à pele, costumam despertar o interesse dos consumidores. E eles aceitam pagar o preço por todas essas qualidades. Entre as principais empresas de cosméticos do país, o tíquete médio das compras feitas por homens gira em torno de R$ 100.
“Sabemos que o homem é racional e objetivo na hora de se cuidar. Ele procura por produtos que mostrem benefícios e resultados tangíveis, e espera que tais itens sejam personalizados, criados com foco em seus interesses e desejos”, conclui Basilio, da ABIHPEC.
A evolução das vendas em algumas categorias
Nos últimos cinco anos e a previsão até 2021, em R$ milhões
Fenômeno estimula cuidados com a saúde dos homens
A busca de orientação para cuidar da pele, da barba e do cabelo tem levado mais brasileiros a procurar ajuda médica. A dermatologista Denise Steiner conta que há dez anos era raro um homem aparecer em seu consultório com queixa relacionada à qualidade da pele, aparecimento de rugas ou manchas. “Agora, cerca de 30% dos meus pacientes são homens”, ela diz. “Eles vêm espontaneamente em busca de soluções para melhorar a aparência da pele, prevenir o envelhecimento e manter um rosto mais bem cuidado.”
O tricologista Luciano Barsanti, diretor médico do Instituto do Cabelo e presidente da Sociedade Brasileira de Tricologia (SBC), confirma essa tendência. Segundo ele, no passado o que levava os homens ao consultório era principalmente a luta contra a calvície. “Hoje, chegam por diversos motivos”, afirma. “Buscam, por exemplo, orientações ou tratamentos para tornar a barba mais densa, hidratada e brilhante ou para cuidar de acnes, dermatites ou foliculites.”
Estimular a ida dos homens ao médico, mesmo que inicialmente apenas por razões estéticas, é outro benefício dessa transformação. A partir do dermatologista, eles podem receber orientação e incentivo para buscar outros tratamentos preventivos, um cuidado que, como se sabe, não é uma prática comum entre os brasileiros.